Como fluir na Primavera – como agir e o que comer

No texto clássico de filosofia chinesa Lü Shi Chun Qiu, datado do século III a.C., existe uma parábola que fala sobre um homem muito forte chamado Wu Huo e um touro.
Wu Huo, mesmo utilizando toda sua força para puxar o rabo do animal, não conseguia movimentá-lo pra trás. Contudo, uma criança era capaz de puxar esse mesmo touro apenas segurando a argola em seu nariz.
Por que isso acontecia? Wu Huo tentava puxar o touro contra sua direção natural, enquanto a criança puxava na mesma direção em que ele naturalmente se movia.
O texto continua e fala sobre a importância de seguir o movimento natural da vida para obtermos saúde e longevidade.
A palavra chinesa usada para descrever “mover-se no curso natural” é shun (順), que é grafada com a junção de dois ideogramas que significam cabeça(頁) e rio(川). A imagem é clara, é como um mergulho em um rio. Ela é o original do “seguir o fluxo”, que para não ser confundido com obediência, ou comportamento manada, onde muitas vezes cedemos a pressão do grupo, gosto de chamar de ‘estado de fluxo’, estado onde estamos ancorados na conexão com a vida, ancorados no movimento do que pulsa e vive.

A Medicina Chinesa concorda que um dos métodos mais importantes de se viver uma vida longa e com saúde é entender os padrões básicos da natureza e nos movimentar levando em consideração suas características. É prudente não ignorá-los, pois podemos acabar por agir no contra-fluxo, puxando o rabo do touro, gastando nossa força e energia, fragilizando a saúde do nosso corpo.

Para tomarmos conhecimento da “direção do touro” precisamos estar atentos ao mundo. E aqui, escrevo pequenas dicas de onde podemos colocar nossa atenção para entrarmos em harmonia com o que nos rodeia. Nesse caso, vou falar sobre os cuidados e ações pulsantes da estação do ano que se inicia, a primavera.

A primavera é considerada o momento do desenvolvimento da vida, é a hora do crescimento e da expansão. O elemento dessa estação é a Madeira, e temos a predominância do vento. O vento afeta nosso Fígado (Gan), que por sua vez pode afetar nosso Baço (Pi). É comum portanto, problemas musculares, torcicolos com o vento da primavera chegando, como também problemas digestivos causados por um Fígado influenciado por nossa intemperanca.

O Huang Ji Nei Jing, um dos escritos mais antigos e importantes sobre matéria médica chinesa, tem um capítulo onde ele fala exclusivamente da importancia de estarmos em harmonia com cada uma das estações do ano afim de conservar nossa saúde e evitar que desequilíbrios ocorram.
Ele recomenda que na primavera, para devidamente nutrir a vida, o relaxamento esteja presente. É a epoca de dar, não retirar, reconhecer, recompensar, e não punir.
Se não estamos atentos ao fluxo da primavera, machucamos nosso Fígado e ficamos sem suporte para o crescimento. Se não crescemos na primavera, o verão, onde as transformações ocorrem, os frutos nascem, também é afetado.

Estamos na época do movimento, da atividade, então dormir mais tarde é permitido, e acordar cedo necessário. Caminhar pela manhã nas praças, parques ou jardins é uma atividade mais do que bem vinda.

É importante comer alimentos que ajudem a equilibrar o elemento Madeira ao invés de consumirmos o sabor azedo, o correspondente da estação. Devemos aumentar o doce para proteger a Terra, aumentar o picante que modera a Madeira e nutre a Água.
Os vegetais devem ser ligeiramente cozidos, as sopas leves e rápidas (sem muito tempo de panela). É hora de moderar o apetite para que a digestão não seja afetada.

Devemos também proteger bem a região do pescoço, lugar por onde o vento penetra com facilidade em nosso corpo. Para isso, podemos bater com as pontas dos dedos na parte superior do trapézio relaxando a musculatura e fazer uso de lenços em volta do pescoço evitando a rigidez da região.

Essas são recomendações gerais, onde queremos favorecer a atividade e o crescimento, com atenção para que a Madeira não se sobrecarregue. Dependendo dos desequilíbrios já instalados em cada um e de suas particularides, podemos sempre consultar o profissional de Medicina Chinesa.

Feliz primavera!

E que essas dicas guiem nossa atenção, mas não endureçam nosso coração!

*

Escrevi parte desse texto traduzindo o que Henry MacCan nos contou aqui 
E parte, o que li no Manual do Herói da Sonia Hirsch.

Aliás, aqui vai uma tabela presente em seu livro sobre exemplos de alimentos doces (não estamos falando aqui de balas e quindins) e picantes, ideais para serem consumidos na primavera.

DOCE / PICANTE
Arroz integral, cenoura

PICANTE / DOCE
Agrião, canela, cebola, farelo de arroz, hortelã pimenta, inhame, rabanete.

DOCE
Abóboras, abobrinha, alcaçuz, alga ágar-ágar, amêndoa, amendoim, amora, anchova, arenque, atum. Banana, batata doce, berinjela, beterraba, boi, broto de bambu. Cabelinho de milho, caldo de cana, camarão, cará, carneiro, carpa, castanha portuguesa, cereja, cevada perolada, chuchu, coco, cogumelo shitake, couve-flor. Enguia, ervilha, espinafre, estrujão. Farelo de trigo, feijão branco, feijão de corda, feijãozinho verde, fígado de boi e de galinha, figo, framboesa, frango. Ganso, geléia real, gergelim preto, girassol (semente), goiaba. Leite de ovelha, leite de vaca, lótuz (raiz). Maça, maltose, manteiga, mel, melancia, melão, milho, moela de galinha. Noz. Óleo de amendoim e de gergelim, ovos. Pato, peixes de carne branca, pepino, pera, pinhão. Repolho, rim de carneiro. Salsa. Tâmara, tartaruga, tofu, trigo.

PICANTE
Açafroa, alecrim, alho, aneto, coentro, cominho, endro, erva doce, folha de inhame, folha de mostarda, folha de tabaco, gengibre, germe de trigo, hortelã, louro, manjericão, noz-moscada, orégano, pimentas em geral, pimentões, pistache.

DOCE / ÁCIDO / PICANTE
Azeitona

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